Notícia: Um medicamento realmente novo para leishmaniose, doença de Chagas e doença do sono

Publicado em 16 de ago. de 2016

Um medicamento realmente novo para leishmaniose, doença de Chagas e doença do sono


Doenças atacam 20 milhões de pessoas, matando 50 mil ao ano
Um medicamento realmente novo para leishmaniose, doença de Chagas e doença do sono

A doença de Chagas, a leishmaniose e a doença do sono atacam 20 milhões de pessoas, matando 50 mil ao ano. Agora, de uma tacada, os cientistas descobriram uma nova droga que promete curar as três doenças. Vale a pena entender como isso foi possível.

Quando uma bactéria começa a se dividir dentro do seu corpo você toma um antibiótico. As bactérias morrem, e as células do seu corpo não são afetadas. Mas, quando uma célula do seu corpo começa a se dividir de maneira descontrolada (um câncer), o tratamento é difícil e penoso.

A maioria das drogas que matam as células cancerosas também mata as células do seu corpo. O resultado são tratamentos pouco eficazes e vários efeitos colaterais. Essa diferença se deve a um fato simples: as bactérias são seres vivos muito diferentes dos seres humanos. Basta descobrir uma droga que bloqueie um desses mecanismos para matar as bactérias sem afetar nossas células. É esse o princípio dos antibióticos. Já as células cancerosas são extremamente semelhantes às normais e têm poucos mecanismos de funcionamento que não existem nas células do nosso corpo.

Por esse motivo, é muito difícil desenvolver drogas que matem as células cancerosas sem matar as normais. Quanto menor a diferença entre o ser vivo que desejamos combater e o nosso organismo, mais difícil desenvolver drogas específicas e eficazes. Assim, é mais fácil combater bactérias que fungos, fungos que parasitas, e parasitas que células cancerosas.

Os parasitas que causam a doença de Chagas, a leishmaniose e a doença do sono são protozoários, mais semelhantes aos mamíferos que os fungos e bactérias. O desenvolvimento de drogas eficazes tem sido lento. O fato de essas doenças afetarem pessoas pobres contribui para essa lentidão.

Como esses parasitas são aparentados, os cientistas imaginaram que, se descobrissem uma droga que matasse simultaneamente os três parasitas sem afetar células de mamíferos, muito provavelmente essa droga estaria atacando um mecanismo único, ausente nas células de mamíferos.

Com base nessa ideia, foi desenvolvido um ensaio para testar 3 milhões de compostos diferentes (isso mesmo, 3 milhões) nos três parasitas e em células humanas. O objetivo era selecionar compostos com as seguintes características: deveriam atuar em pequenas doses; matar simultaneamente os três parasitas; e ter um índice de seletividade de 5x (deveriam ser 5 vezes mais tóxicos para os parasitas do que para as células de mamíferos). Após testar os 3 milhões de compostos, cientistas de universidades e de uma indústria farmacêutica identificaram um composto chamado GNF5343 que tinha essas características.

Com base na estrutura química do GNF5343 os cientistas sintetizaram uma grande família de compostos semelhantes, que foram novamente testados para verificar se eram melhores do que o original. E assim chegaram ao GNF2636, que era ainda melhor. Esse ciclo foi repetido mais duas vezes, e finalmente os cientistas criaram uma molécula chamada GNF6702, capaz de matar os parasitas com doses muito pequenas e que é praticamente inofensiva para células de mamíferos (seletividade maior que 1.000x). Quando esse composto foi usado para tratar camundongos infectados com cada um dos três parasitas os cientistas observaram que os parasitas foram eliminados rapidamente e os camundongos foram curados, quase sem efeitos colaterais.

Ao investigar o modo de ação dessa nova droga os cientistas descobriram que ela age sobre um componente de uma organela chamada proteossomo, uma das poucas organelas características desses três parasitas e muito diferente do sistema equivalente dos mamíferos.

O resultado é que a humanidade dispõe de uma droga capaz de curar essas três doenças em camundongos. Os testes em seres humanos são o próximo passo e, se forem bem-sucedidos, teremos um novo remédio capaz de curar 20 milhões de pessoas e evitar milhares de mortes todos os anos.

Fonte: O Estado de S. Paulo



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