O mal de Alzheimer é um diabetes que ocorre no cérebro. A comparação pode parecer estranha, mas é a conclusão de vários pesquisadores que estudam como a demência mais comum do mundo se desenvolve. Responsável por cerca de 60% desses casos, o Alzheimer é caracterizado por um processo de inflamação gerado pelo acúmulo de toxinas no cérebro. Esta inflamação é ocasionada, em grande parte, pela resistência à insulina, hormônio que, além de regular a quantidade de glicose no sangue, é importante para proteger os neurônios e manter a memória. A afirmação é da pesquisadora do Instituto de Bioquímica Médica da UFRJ e do Instituto D´Or de Pesquisa e Ensino (Idor), Fernanda de Felice. Estudiosa do assunto há sete anos, ela apresentou sua pesquisa no simpósio internacional “Frontiers in Protein Misfolding in Neurodegenerative Diseases and Câncer”.
Fernanda explica que as tais toxinas que, se acumuladas, costumam desencadear um quadro de demência, estão presentes em todos, porém “adormecidas”. O que ocorre é que elas passam a se multiplicar no cérebro de muitas pessoas, à medida que elas envelhecem. Elas atacam as conexões entre os neurônios, o que ocasiona a perda de memória. E um importante agente para evitar o acúmulo dessas toxinas é justamente a insulina. Seria por isso, portanto, que os diabéticos — que têm resistência a essa substância — têm mais tendência a desenvolver Alzheimer.
— Assim como no diabetes, no mal de Alzheimer as pessoas também resistem à insulina. Nas duas doenças, há processos inflamatórios. Na primeira, o processo ocorre no corpo, e na segunda, no cérebro. Por isso fazemos a analogia entre elas — afirma a pesquisadora.
A partir disso, é possível concluir que evitar o desenvolvimento de diabetes ajuda a evitar demência. No entanto, Fernanda ressalta que nem todos os diabéticos desenvolvem, automaticamente, um quadro de Alzheimer. Além disso, o mal tem outras causas que não a resistência à insulina.
— Pacientes que têm diabetes têm um risco aumentado de ter Alzheimer, isso nós sabemos. Mas não são todos os que de fato desenvolvem a doença, talvez porque alguns têm uma característica genética que torne o cérebro protegido. Mas ainda realmente não se sabe porque alguns diabéticos têm Alzheimer e outros, não — diz ela.
Segundo a pesquisadora, medicamentos usados no tratamento de diabetes podem também ser usados para tratar demência, especialmente se ela for detectada precocemente. Entretanto, como os remédios para diabéticos não chegam ao cérebro — porque não rompem a barreira hematoencefálica, que protege o sistema nervoso —, é preciso fazer testes modificando-os para que alcancem os neurônios. Isso já vem acontecendo nos Estados Unidos.
— O presidente Barack Obama lançou, em 2012, duas grandes iniciativas para o tratamento de Alzheimer. Uma é um anticorpo e outra é uma administração intranasal de insulina. Esta última está em testes por lá e está se saindo muito bem. Essa administração intranasal não afeta a glicose periférica, então pode ser usada mesmo por alguém que tem Alzheimer mas não tem diabetes — conta Fernanda. — Enquanto isso não for aprovado e vendido, é importante lembrar que ninguém pode, por conta própria, aplicar pelo nariz medicamentos para diabetes achando que vai se tratar de Alzheimer. E se a pessoa já for diabética, também não adianta aumentar as doses de insulina, porque ela não chega ao cérebro e isso pode piorar o quadro.
A associação entre diabetes e Alzheimer está tão em alta que foi o tema do Congresso Internacional Anual de Diabetes (ADA) do ano passado.
Créditos da Notícia: Clarissa Pains