O jeito que uma pessoa dorme, indicam pesquisadores da Universidade Stony Brook, nos Estados Unidos, pode exercer efeito significativo sobre a saúde neurológica dela. Se for de lado, alivia o acúmulo de resíduos do cérebro que contribuem para doenças como Alzheimer e Parkinson. Isso acontece porque a posição, naturalmente preferida pela maioria dos animais, libera as vias responsáveis pela limpeza do lixo metabólico.
A via glinfática é uma área do cérebro responsável pela remoção de resíduos e excesso de líquido formados especialmente durante a vigília. A região foi descoberta há pouco tempo e detalhada, pela primeira vez, em agosto de 2012 na revista especializada Science Translational Medicine. Basicamente, funciona como uma espécie de via linfática exclusiva do cérebro, sendo útil na remoção de produtos residuais, como as beta-amiloides e a proteína tau. Ambas são excessivas em indivíduos com Alzheimer, o que faz com que se acredite que sejam, na verdade, as responsáveis pelo desenvolvimento da doença.
O sistema glinfático foi estudado detalhadamente, pela primeira vez, por pesquisadores da Universidade de Rochester, também dos Estados Unidos, em modelos animais. Quando funciona de forma normal e eficiente, a limpeza contínua promovida por ele assegura que substâncias tóxicas em excesso não se acumulem no cérebro. As beta-amiloides, por exemplo, podem se juntar e formar placas resistentes. Além de serem dificilmente removidas, elas enfraquecem as sinapses, a comunicação entre os neurônios, provocando demência.
Com exames de ressonância magnética, a equipe liderada pela professora Helene Benveniste observou de perto o caminho do fluido cerebrospinal — substâncias que funcionam como produtos de limpeza — em ratos anestesiados para dormir em três posições: lateral, de bruços e de costas. Pelas imagens, descobriram que dormir de lado é a forma que faz com que a via funcione melhor. “Os roedores que estavam em posição lateral tiveram limpeza de beta-amiloide 25% melhor do que as que estavam dormindo de costas ou de bruços. Provavelmente, a razão pela qual as outras posições não são ideais é porque o fluido de limpeza não consegue chegar ao cérebro, desaguando em outros lugares, como a medula espinhal”, explica a responsável pelo estudo, publicado recentemente no The Journal of Neuroscience.
Espaços ampliados
De forma geral, o sono e a inconsciência promovida pela anestesia parecem melhorar a remoção de resíduos por meio da via glinfática porque o espaço entre as células é ampliado, facilitando que os resíduos sejam eliminados do cérebro. A vigília, por outro lado, abranda esse transporte porque algumas substâncias químicas no cérebro, como a noradrenalina, aumentam, preenchendo o espaço entre as células.
“Também tem sido demonstrado que os padrões de respiração podem influenciar o fluxo dos fluidos de limpeza em seres humanos e que a pulsatilidade do sono acelera o transporte”, explica Benveniste. Segundo ela, ainda é muito cedo para estudar o mecanismo observado em ratos em seres humanos. Mas existem testes radiológicos que usam a mesma abordagem. Marcadores radioativos são injetados nas substâncias de limpeza presentes na espinha, e a distribuição do marcador é seguida no cérebro ao longo do tempo.
Esses testes são chamados de cisternotomografia de radionuclídeo e utilizados em muitos centros médicos para avaliar a ocorrência de vazamento de fluido cerebrospinal, de hidrocefalia ou de hipertensão intracraniana benigna. Muitas vezes, porém, demora muito para sair o resultado, e os pacientes têm que ter o cérebro escaneado várias vezes ao longo de dois ou três dias. Por serem inconclusivos, os dados que medem a qualidade ou a posição do sono nunca são levados em consideração.
Como potencializar
Benveniste frisa que ainda é muito cedo para recomendar que as pessoas durmam de lado, mas antecipa que o próximo passo da equipe é estudar o mecanismo no cérebro humano, que é muito maior do que o de um roedor. Atualmente, ela trabalha na investigação de como o sistema pode ser controlado e mantido ao longo da vida de modo a maximizar a depuração de resíduos, prevenindo, assim, doenças. “Além disso, estamos trabalhando no desenvolvimento de plataformas e ferramentas de diagnóstico para quantificar o transporte glinfático e a depuração de resíduos do cérebro, o que será essencial para a interpretação de dados futuros”, diz.
A pesquisadora também alerta que a interpretação dos experimentos realizados por ela e a equipe com roedores anestesiados não retratam o mesmo tipo de inconsciência durante o sono de um ser humano. “Também é bem sabido que as pessoas mudam a posição do corpo durante a noite, o que pode afetar a depuração de resíduos do cérebro. Essas são questões importantes e que devem ser levadas em consideração”, esclarece.