Notícia: Cientistas identificam proteína que pode anular efeito de drogas contra depressão

Publicado em 18 de ago. de 2015

Cientistas identificam proteína que pode anular efeito de drogas contra depressão


Cerca de 40% das pessoas diagnosticadas com a doença não reagem aos medicamentos e ainda desenvolvem sequelas
Cientistas identificam proteína que pode anular efeito de drogas contra depressão

Uma ciência pouco conhecida fora dos meios acadêmicos abre caminho para aliviar o sofrimento de pessoas acometidas por uma doença tão comum quanto misteriosa. A depressão afeta cerca de 10% da população mundial, segundo estimativas da Organização Mundial de Saúde (OMS). Mas faltam tratamento e diagnóstico eficientes. Uma forma de melhorar o tratamento foi o alvo de um trabalho com proteômica, que estuda a ação das proteínas em determinados momentos e circunstâncias. Uma ciência complexa para investigar aquela que é uma das mais complicadas doenças neuropsiquiátricas. Sequer sobre sua causa há consenso e pistas conclusivas.

Oficialmente, existem 350 milhões de pessoas diagnosticadas — mais do que um Brasil e meio. Pelas contas da OMS, 40% dos deprimidos não respondem ao tratamento e muitos sofrem efeitos colaterais, de alergias a problemas sexuais e de peso. E são essas pessoas as potenciais beneficiadas pela descoberta de pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). A equipe liderada pelo bioquímico Daniel Martins de Souza descobriu uma forma de identificar quem integra esse grupo que não responde à medicação, o que abre caminho para oferecer uma terapia mais eficiente.


— A meta é oferecer o remédio certo para cada paciente — diz Martins. 

 
Isso significa aliviar o sofrimento da mente — a depressão devasta o humor e o ânimo, erode a autoestima e a concentração e traz uma agonia constante de pensamentos em morte e suicídio — e os do corpo, associados a efeitos colaterais de medicamentos. A equipe da Unicamp se debruçou sobre a chamada depressão clínica, uma doença psiquiátrica crônica, diferente da tristeza profunda que pode atormentar qualquer pessoa sob grande estresse emocional, como o provocado por perdas e traumas.

RESPOSTA EM UM SIMPLES EXAME DE SANGUE

Martins criou há pouco mais de um ano o Laboratório de Neuroproteômica da Unicamp. Aplica lá o conhecimento que trouxe do Instituto Max Planck de Psiquiatria, na Alemanha, e do Instituto de Biotecnologia da Universidade de Cambridge, na Inglaterra.

— Temos duas linhas de pesquisa. Uma busca revelar as bases moleculares da depressão e da esquizofrenia. A outra procura identificar biomarcadores (espécies de etiquetas biológicas) para essas doenças — explica o cientista.

E foi exatamente isso o que ele fez num trabalho iniciado na Alemanha e que teve prosseguimento em Campinas. Analisou proteínas ativas no sangue de pacientes com depressão — amostras coletadas de voluntários na Alemanha — antes e depois da medicação.

 

— Os medicamentos, na verdade, controlam os sintomas, mas não a doença. E, ainda assim, um número muito grande de pacientes não responde a tratamento algum. Essas pessoas tomam remédios fortes, sofrem efeitos colaterais, e os sintomas da depressão permanecem. Queríamos entender o motivo e encontrar uma forma de contorná-lo — salienta Martins.

Hoje os médicos não têm muita opção além de trocar a dose ou mudar a medicação. Além do sofrimento da doença não tratada, há ainda real risco de morte. Nos Estados Unidos, 3% das pessoas com desordens depressivas cometem suicídio. Elas representam 60% dos casos de suicídio nos EUA — no Brasil, não há estimativas semelhantes.

O grupo de Martins encontrou uma possível causa para a falta de ação dos medicamentos. E, curiosamente, nada tem a ver com genes já associados à doença. E, sim, com uma proteína chamada fibrinogênio, essencial para a coagulação do sangue.

— Pacientes com mais fibrinogênio no sangue tendem a não responder aos remédios — explica Martins.

Em tese, um exame de sangue simples poderia identificar essas pessoas e ajudar os médicos na prescrição dos remédios.

— O fibrinogênio tem muitas funções. Um estudo com 75 mil pacientes com depressão já o havia associado à doença. Nossa hipótese é que ele “sequestre” o medicamento — diz o cientista.

Isso aconteceria porque o fibrinogênio é, a grosso modo, “aderente” a algumas outras moléculas. As dos antidepressivos estariam neste caso.

— O fibrinogênio se ligaria aos antidepressivos e os impediria de chegar ao cérebro. Essa é nossa aposta no momento — acrescenta.

O lado particularmente bom da descoberta é que o fibrinogênio é relativamente fácil de ser controlado. Sabidamente, o ácido acetilsalicílico (princípio ativo da aspirina) faz isso.

— Confirmar esse dado é o nosso próximo passo — diz Martins.


Créditos da Notícia: Ana Lúcia Azevedo
Fonte: O Globo

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