Um kit de diagnóstico de febre chicungunha confiável e com preço competitivo para que qualquer pessoa com suspeita da doença possa ser testada em todo o Brasil. Este deve ser, a médio prazo, o resultado de um trabalho que já dura três anos no Instituto Carlos Chagas (ICC)/Fiocruz Paraná: em fevereiro, a equipe liderada pela virologista Cláudia Nunes Duarte dos Santos, coordenadora do laboratório de virologia molecular do ICC, isolou o vírus causador da febre em amostras humanas vindas de Feira de Santana, na Bahia.
Atualmente o teste laboratorial existe, mas não em larga escala. Na maioria das vezes, a doença é apontada por um diagnóstico clínico epidemiológico, com informações sobre uma região onde o vírus está circulando, combinada com os sintomas de febre e dores articulares. A equipe da Fiocruz Paraná trabalha com dois horizontes: um teste rápido para ser feito à beira do leito em 15 minutos, e um teste Elisa (sigla para Enzyme- Linked Immunosorbent Assay), exame que permite a detecção de anticorpos no sangue, já usado no diagnóstico de várias doenças.
— Hoje sabemos que temos outras cepas de vírus no Brasil. Uma foi sequenciada e tem uma mutação no genoma que permite que, além do Aedes aegypti, o vírus cresça no mosquito Aedes albopictus, que suporta temperaturas mais baixas e é muito agressivo — explica a pesquisadora. — Esses mosquitos têm poder epidêmico muito grande, por isso o diagnóstico diferencial é importante. Também porque a doença pode ser confundida com outras, como a dengue.
A febre chicungunha foi detectada pela primeira vez em 1952, na fronteira da Tanzânia com Moçambique, e se espalhou por África e Ásia. No fim de 2013 a doença foi registrada pela primeira vez nas Américas. Até janeiro de 2015, mais de 1,135 milhão de casos suspeitos foram registrados nas ilhas do Caribe, em países da América Latina e nos EUA, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS). E 176 mortes foram atribuídas a ela no mesmo período.
No Brasil, o último Boletim Epidemiológico divulgado pelo Ministério da Saúde aponta 771 casos autóctones suspeitos no país, sendo 82 confirmados (nove por exame laboratorial e 73 por diagnóstico clínico epidemiológico), 687 em investigação e dois descartados no período de 4 de janeiro a 7 de fevereiro deste ano. Os estados de Amapá, Mato Grosso do Sul, Goiás e Bahia, além do Distrito Federal, são os afetados.
Há três anos, quando o trabalho do laboratório de virologia molecular do ICC começou, o vírus da febre chicungunha sequer circulava no Brasil, mas os pesquisadores já previam, pela dispersão que acontecia nas ilhas do Oceano Índico, que a doença viria para as Américas. A equipe, então, sintetizou quimicamente o gene do vírus e, a partir dele, produziu uma proteína recombinante. Num primeiro momento, até era possível produzir insumos antígenos e anticorpos para fazer o diagnóstico, mas ainda não havia amostras de soro de pacientes para validar isso.
Depois disso, uma parceria com o Instituto Pasteur da Guiana Francesa enviou amostras de pacientes, mas numa fase específica da doença — o interessante é ter pacientes em diferentes fases, e elas são três. A primeira é quando há vírus circulante no organismo; já na fase aguda são criados os anticorpos; e a terceira é a de convalescença.
— Recentemente, o Instituto Gonçalo Muniz, na Bahia, reuniu pesquisadores, médicos e enfermeiros envolvidos com o vírus, e, a partir desse contato, conseguimos um painel de amostras de pacientes de Feira de Santana na fase aguda, nos primeiros cinco dias da doença — conta Cláudia. — Recebemos as amostras, inoculamos o vírus nas células de mosquito em cultura e conseguimos fazer o isolamento — comemora.
Fonte: O Globo