Notícia: Único fabricante de medicamento para câncer suspende produção

Publicado em 19 de fev. de 2015

Único fabricante de medicamento para câncer suspende produção


Em todo o Brasil, 700 crianças dependem do medicamento todos os anos
Único fabricante de medicamento para câncer suspende produção

Um dos quimioterápicos utilizados para combater dois tipos de cânceres raros na infância está em falta na rede pública e particular de saúde do Distrito Federal e deve começar a faltar em todo o país. O laboratório Bagó, único que fabrica o medicamento no Brasil, informou ao Ministério da Saúde que fornecerá a Dactinomicina D, comercializada com o nome Cosmogen, apenas pelos próximos três meses.

O G1 entrou em contato com o laboratório Bagó, mas uma atendente informou, por telefone, que a empresa está em recesso e só retoma as atividades na próxima segunda-feira.
 
O Ministério da Saúde afirmou que “já iniciou o processo de aquisição do medicamento”, o que inclui “busca do produto ou similares no mercado internacional, garantindo a assistência aos usuários do SUS”.
  
A pasta informou ainda que o cancelamento do registro pelo laboratório foi feito em julho do ano passado e, portanto, a empresa deve fornecer o quimioterápico por 12 meses após o comunicado, ou seja, até julho deste ano.

Documento ao qual o G1 teve acesso revela que um encontro entre representantes do Ministério da Saúde e do laboratório foi realizado no dia 26 de janeiro deste ano para discutir o problema. “Nesta reunião, foi informado pela Bagó, através de acordo verbal, que tem estoque disponível e fornecerá o medicamento por mais três meses.”

O documento explica ainda que “a falta de medicação está associada à troca de fornecedor de matéria-prima e não à falta de matéria-prima da medicação”. O problema não afeta apenas a rede pública, mas também hospitais particulares de todo o país.

No DF, a Secretaria de Saúde confirmou, por meio de nota, que “trata-se de um remédio padronizado” e que “no momento não tem [o produto] no estoque”. A pasta disse ter tomado providências para  a compra do quimioterápico utilizado para inibir a multiplicação de células cancerígenas e o seu crescimento.

A situação preocupa pais de crianças com a doença. Daniel Soares, 3 anos, diagnosticou em julho do ano passado um tumor subcutâneo (rabdomiossarcoma) na região dos testículos e começou o tratamento uma semana depois.

“Sem esse remédio, a chance de cura de quase 90% cairia para 45%. Sem esse remédio ele poderia até morrer porque é um tumor que não causa dor e não é aparente”, disse o pai, o defensor público André Soares.

Segundo ele, o tratamento com Dactonomicina é menos invasivo. “Para debelar um câncer mais agressivo com outra medicação, além de ser mais invasivo, é três ou quatro vezes mais caro”, afirma.

O tratamento de Daniel durou sete meses, mas André teme pela necessidade de outras crianças. Em todo o país, 700 recebem o medicamento para tratamento da doença. “Se o único laboratório do país diz que não vai mais produzir, o Ministério da Saúde tem que quebrar a patente para que laboratórios menores possam fornecer. Não vai faltar o remédio, já está faltando, e a produção será interrompida nos próximos meses. Se não houver uma intervenção, muitas crianças vão morrer.”

O defensor criticou a decisão do laboratório. “Não faz sentido que esta decisão de não fornecer mais o remédio se baseie em uma lei de mercado. Não teriam coragem de fazer isso na Europa ou nos Estados Unidos.”

A oncologista pediatra e professora da Universidade de Brasília Juliana França destaca que o medicamento é essencial para dois cânceres raros: tumor de Wilms, que aparece nos rins e afeta principalmente crianças, e  rabdomiossarcomas, tumor subcutâneo que afeta músculos e pele.

“No tratamento desses dois cânceres da infância, ele é insubstituível por outro tipo de quimioterápico. A vantagem é que tem menos efeito colateral e tem atividade tumoral que nenhum outro tem.  Ficando sem ele, as chances de cura diminuem consideravelmente”, explica a médica.

A oncologista disse ainda que no serviço particular, o medicamento já está em falta em alguns hospitais, mas as famílias de pacientes têm opção de importar o medicamento diretamente.

“Nem sempre o custo é repassado para o convênio e nenhum hospital pode importar diretamente porque o pedido é feito diretamente pela família. Ou seja, já não basta o diagnóstico e o afastamento da criança da escola, a família ainda tem que se preocupar em adquirir a medicação e considerar que haverá um atraso no início do tratamento até a chegada do quimioterápico. A única iniciativa em curto prazo seria isso. No serviço público, a situação aí é caótica”, destacou a oncologista.

Fonte: G1



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