Normalmente associado à idade avançada, o declínio cognitivo do órgão pode se iniciar até na casa dos 20 anos: 24, mais exatamente. Essa foi a conclusão de um novo estudo realizado por cientistas da Universidade Simon Fraser, no Canadá. O trabalho foi publicado na revista científica “PLoS ONE”. Para chegar a essa constatação, os pesquisadores avaliaram 3,3 mil voluntários cujas idades variavam entre 16 anos e 44 anos.
Eles participaram de um jogo, em tempo real, desenvolvido pela equipe de pesquisa, que simulava situações reais do cotidiano. A concentração dos candidatos foi posta à prova com tarefas de múltipla escolha e também com questões de longo prazo e mudanças de foco.
Assim, foram analisadas as relações entre a idade e a velocidade com que tomamos decisões e mudamos nossas tarefas. O jogo procurava retratar situações comuns ao nosso cotidiano. O desempenho dos jogadores foi gravado e analisado posteriormente.
Como era de se esperar, a velocidade com que as decisões eram tomadas foi se reduzindo com o avançar da idade. Mas a queda no desempenho não demorou: começou a ser detectada já aos 24 anos. Para quem acha que sabe tudo, é bom ficar de olho.
O estudo demonstrou que, após essa idade, a cada 15 anos, o ritmo cognitivo cai cerca de 15%. E não tem chororô: segundo os responsáveis pelo estudo, ninguém ficou de fora, nem mesmo os jogadores que conseguiram se aprimorar na execução das atividades do jogo. O declínio cerebral permaneceu mesmo entre aqueles com mais habilidade de jogar.
Na avaliação do neurologista Fabrício Hampshire, professor da Faculdade de Medicina de Petrópolis, os resultados sinalizam que o processo de declínio cognitivo é dinâmico e se inicia muito antes da chamada terceira idade.
Mas ele também entende que os dados precisam ser relativizados.
— A perda neuronal começa bem antes dos 60 anos, mas novos neurônios também surgem constantemente. Do ponto de vista clínico, essa informação não gera nenhuma intervenção prática ou necessidade de medidas preventivas além das que já conhecemos. As publicações cientificas devem sempre ser analisadas com critério para que precipitações sejam evitadas — avalia.
O especialista também lembra que a morte de neurônios é um processo contínuo que piora com o tempo e acontece mais rápido na presença de doenças específicas, como o Alzheimer.
SEDENTARISMO, O GRANDE INIMIGO DA CABEÇA
Por outro lado, o envelhecimento cerebral precoce não seria devido ao estilo vida moderno, que nos expõe constantemente a estímulos por meio de computador, internet, celular e televisão? Fabrício descarta a hipótese.
— À luz da ciência, o que pode interferir na prevenção do processo é a prática de atividade física regular, de pelo menos 150 minutos por semana, e do exercício do cérebro, por meio da leitura — afirma o neurocientista.
— O sedentarismo faz muito mal aos neurônios.
Além disso, o tipo de dieta alimentar que temos e a quantidade de horas de sono também interferem.
O estresse psicológico e a presença de doenças como a hipertensão e o diabetes influenciam diretamente no problema.
Osvaldo Nascimento, professor do Departamento de Neurologia da Universidade Federal Fluminense (UFF), concorda: — Aspectos de ordem social, problemas afetivos, trânsito engarrafado: tudo isso determina o comportamento do nosso cérebro — descreve.
O especialista explica que, na casa dos 20 anos, nosso corpo começa a se expor a uma espécie de curva biológica: — Todo o nosso organismo sofre uma queda de produção.
Não é diferente com o sistema nervoso. Ocorre um declínio da atividade dos nervos responsáveis pela transmissão de estímulos.
É algo normal.
Com o declínio, funções responsáveis pelas decisões ou pelo reconhecimento de pessoas ou histórias são prejudicados. Mas calma, nem tudo está perdido só porque chegamos aos 24 anos.
O estudo canadense também observou que, com a redução da velocidade cognitiva, o cérebro compensa o déficit de várias formas.
Baseando-se na experiência, ele antecipa de maneira precisa futuras tarefas e cria atalhos mentais que permitem eliminar informações irrelevantes.